Dia do Grito: a história por trás de um dos mais desconhecidos feriados, celebrado em Olinda

Muita gente não sabe, mas o dia 10 de novembro tem marca no calendário e é até feriado em municípios como Olinda: é o dia do grito. Isso porque, dada a vocação pernambucana em ser pioneira, foi na cidade que ocorreu o primeiro grito de república da América Latina, há pouco mais de 300 anos. O marco ocorreu no “senado da câmara” olindense, próximo de onde hoje funciona o Mercado da Ribeira, no bairro do Carmo, ainda que tudo que tenha sobrado da plataforma política tenha sido uma estrela prateada que recontava o ocorrido, de 1710. A rua foi rebatizada com o autor do grito, Bernardo Vieira de Melo, ainda que pouco tenha mudado no tal dia.

Ricardo Fernandes/DP/D.A.Press

A república, significa “coisa pública”, mas não foi pensada por Bernardo Vieira de Melo como sendo algo público. O vereador, para começar, era senhor de engenho e não pensava em libertar os escravos. Eles não fariam parte do “povo”. Ainda como capitão-mor, Vieira de Melo participou do extermínio do quilombo dos Palmares juntamente com o bandeirante Domingos Jorge Velho e foi responsabilizado pela morte de quase 400 negros. “A escravidão não seria abolida naquele momento porque a sociedade a enxergava como normal. Era o pensamento da época e isso não siginifica que todas as pessoas eram ruins. É importante dizer isso porque muita gente pensa que as pessoas eram más”, explica o doutor em história pela UFPE Marcos Carvalho. “Mesmo os ex-escravos tinham escravos.” Para se ter uma ideia de como a escravidão era comum, Vieira de Melo se tornou governador do Rio Grande do Norte por sua atuação no quilombo dos Palmares. Sua atuação foi “reconhecida” a ponto de nomear importantes vias tanto em Natal, como em cidades do porte de Jaboatão dos Guararapes.

Segundo o professor de história de UFPE Severino Vicente, a república proposta por Bernardo Vieira de Melo seria controlada por um grupo de pessoas. Certamente da elite, já que o próprio autor do grito fazia parte dela. “Ele queria fazer uma República Veneziana e, com certeza, trabalharia pelos seus próprios interesses. Por outro lado, haveria constituição e, na teoria, todos seriam cidadãos teriam deveres”, avalia.

A guerra dos mascates, ocasião em que o grito foi registrado, eclodiu justamente por uma tensão entre senhores de terra e comerciantes portugueses, chamados de mascates. Os engenhos estavam em crise depois de perderem investimentos holandeses, expulsos do Brasil há 56 anos. Criando a república, Vieira de Melo poderia se ver livre dos lusos e controlar quem concordasse com sua visão.

Vieira de Melo morreu em 1714, numa prisão em Lisboa. Ele acendeu um fogareiro na cela e morreu intoxicado com a fumaça. O grito dele, contudo, é lembrado a cada toque do Hino de Pernambuco. Um dos versos escritos por Oscar Brandão da Rocha, em 1908, faz menção ao grito.

Trecho do Hino de Pernambuco

A República é filha de Olinda,
Alva estrela que fulge e não finda
De esplender com seus raios de luz.
Liberdade! Um teu filho proclama!
Dos escravos o peito se inflama
Ante o Sol dessa terra da Cruz!

Paulo Trigueiro

Paulo Trigueiro

Repórter