Robôs estimulam crianças com autismo em escolas públicas do Recife

Iniciativas pernambucanas ajudam a desenvolver linguagem e interação de diagnosticados no Transtorno do Espectro Autista e marcam o Dia Mundial da Conscientização do Autismo, 2 de abril
Por Alice de Souza

As luzes acesas e a fala programada do boneco prendem a atenção do pequeno Emerson Henrique, 6 anos. Vidrado nas reações mecânicas do objeto laranja e branco, o menino se aproxima e toca a peça, como quem faz um carinho. A reação surpreende a mãe, a dona de casa Vanessa Santana, 26. Emerson é autista e tem síndrome de down, diagnóstico que interfere em seus comportamentos sociais. Tem interação com outros colegas de classe bem restrita, mas está abrindo uma forma diferente de diálogo com o amigo mecânico. A robótica nas salas de aula das escolas públicas do Recife vai além dos programas competitivos – está sendo utilizada para o desenvolvimento cognitivo de estudantes diagnosticados dentro do Transtornos do Espectro Autista (TEA).

Recife recebe primeira sessão adaptada para crianças com deficiência

A rede municipal de ensino do Recife tem 276 alunos com autismo, de 5 a até 15 anos. Eles são menos de 1% de um total de 87 mil estudantes, mas são incorporados às aulas regulares como um desafio educacional diário. Desde abril de 2015, robôs do tipo humanoide estão sendo utilizados para estimular a comunicação e a concentração dessas crianças. São 30 equipamentos, preparados para interagir com elas e fazer a ponte com o conteúdo dado em sala de aula. “Eles são programados para trabalhar a lateralidade, a tentativa de diálogo, partes do corpo humanos, vocabulário através de música e a interação”, explicou a coordenadora de Robótica, Fernanda Barreto.

A ação é baseada em estudos teóricos e experiências realizadas em países como Estados Unidos, Portugal, Inglaterra e México. No mundo, mais de 2 milhões de pessoas têm esse diagnóstico. Uma população crescente, segundo estimativa norte-americana atual, de um caso a cada 68 pessoas. Apesar disso, o acesso aos tratamentos terapêuticos para melhorar a qualidade de vida é quase nulo. Somente 10% dos pacientes brasileiros se beneficiam dos mesmos, considerados elementares para a qualidade de vida e o desenvolvimento.

Para o espectro autista, a iniciativa atua também na apreensão da linguagem e na diminuição do comportamento estereotipado (balançar, movimentos rotativos, bater mãos). “Sabemos que o autista tem dificuldade em olhar para o ser humano”, diz Fernanda Barreto. “O autista tem dificuldade em lidar e compreender as emoções, como a raiva, o carinho. Com o humanoide, a troca é na base da observação, da curiosidade”, acrescenta a professora de Atendimento Educacional Especializado (AEE) Cristiane Paes, que atua na Escola Municipal Rozemar de Macedo Lima, em Casa Amarela.

Em 2015, 27 professores passaram por uma capacitação para utilizar as tecnologias assistivas, o que inclui os robôs humanoides. Cada um deles preparou um projeto de como utilizar a robótica com os alunos e envia, após cada encontro, relatos sobre as evoluções observadas nos estudantes. Os equipamentos disponíveis são apresentados em um circuito de visita de duas escolas por semana. No ano de estreia, foram realizadas quatro visitas em cada uma das 22 escolas onde estão matriculados os alunos diagnosticados. Em 2016, a Secretaria de Educação afirmou que pretende capacitar mais professores para expandir o projeto, cujas atividades serão retomadas no início de abril.

Os robôs humanoides, conhecidos como NAO, são produzidos por uma empresa francesa. De alto custo, chegam sempre às salas ao lado de guardas municipais. Por isso, a depender da disponibilidade de carros para o translado, nem sempre cumprem a agenda prevista da semana. Ao chegar, são levados a uma sala de aula onde estão os alunos, a professora e a coordenadora do projeto na unidade.

NAO (Nao Humanoid Robot)
Dotado de inteligência artificial, é fabricado pela Aldebaran Robotics e utilizado em mais de 450 escolas

altura

câmeras com sensores

microfones

sensores táteis

sensores de pressão

Quando chegou na escola, Emerson era uma criança bem retraída. Não mantinha contato visual, era avesso a toques. Por isso, a interação com a máquina chamou a atenção da mãe Vanessa. “A escola tem sido importante, percebo que ele interage mais com as outras crianças”, afirma. O exemplo de Emerson é apenas um dentre os resultados observados pelos educadores. Alguns alunos, por exemplo, começaram a apresentar linguagem. Os sorrisos de Paulo Rafael, 10, para o NAO não deixam mentir. A relação de fascínio entre os dois lembra de perto a amizade com dois colegas de classe. “Com o robô, Rafinha começou receoso, depois começou a querer interagir, fazer perguntas”, explicou Cristiane Paes, sobre o aluno que até os quatro anos sequer falava.

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Em comemoração ao Dia Mundial da Conscientização do Autismo, celebrado no dia 02 de abril, será lançada uma campanha de financiamento coletivo da plataforma bHave. Idealizada por um grupo de jovens empreendedores, a ferramenta tem como objetivo otimizar o trabalho dos profissionais adeptos à Análise do Comportamento Aplicada (ABA), uma das formas de intervenção com indivíduos que estão no espectro autista, além de entregar uma resposta mais rápida e eficiente para os pais de crianças e jovens em tratamento.

A campanha visa viabilizar a execução da plataforma. “Para cada criança em tratamento é usada uma grande quantidade de papel. Nosso projeto funciona como uma rede social para os profissionais da área. Os resultados obtidos durante as sessões terapêuticas podem ser compartilhados em tempo real para todos que estão envolvidos no caso, eliminando toda a papelada e possibilitando aos profissionais mensurar de forma mais ágil a evolução das crianças”, explica Cauê Nascimento, um dos idealizadores do bHave. A campanha ficará no ar por dois meses e a expectativa é que, uma vez atingida a meta, o bHave já esteja disponível para download em um prazo de seis meses. A partir do dinheiro, será feita a contratação de profissionais de tecnologia da informação.

Também no dia 02 de abril, às 9h, será realizada também uma sessão de cinema adaptada para crianças autistas. Em uma parceria da instituição Ama-Getid, a Cinépolis e do Shopping Guararapes, será exibido o filme “O Bom Dinossauro” (Dublado), sem trailers e com luz e som apropriados. O valor será de R$ 10,00 por pessoa, com pipoca e refrigerante inclusos.

Paulo Paiva/DP
Alice de Souza

Alice de Souza

Repórter

Alice é repórter do Diario e escreve regularmente para a editoria Local, em especial na área de saúde. Não entende nada de robótica, mas é apaixonada por quem entende…

Paulo Paiva

Paulo Paiva

Fotógrafo

Paulo é fotógrafo do Diario. Já se meteu a mexer com robôs, em especial no campo da fotografia…