Candomblé encontra o pentecostalismo: cultos de corpos, fé e fervores
Projeto “Performances de fé: cultos da igreja pentecostal evangélica e ritos do candomblé” desvenda semelhanças entre cerimônias religiosas normalmente tidas como as mais distantes possíveis
Um projeto experimental propenso a fazer o contrário do que muitos pregam: aproximar o candomblé do cristianismo pentecostal. Para isso, apenas fotografias – e o poder silencioso que são capazes de traduzir, tão inquietantes quanto a própria fé. Foi com essa proposta que a bacharel em comunicação Marcela Cintra concebeu, e agora divulga, o seu trabalho. Aproximar mundos supostamente distantes com as semelhanças que muitos prefeririam ignorar não é tarefa fácil, mas é uma das mais nobres funções do fotojornalismo. A experiência, quem conta é ela:
“Desde que me entendo por gente, nunca fui adepta a nenhuma religião. Alguns cultos e segmentos, porém, chamam a minha atenção há um certo tempo. Da curiosidade de entender melhor cultos pentecostais, por exemplo, surgiu a ideia de registrá-los. Das conversas e discussões sobre o assunto, veio a proposta de compará-los ritos do candomblé, a fim de verificar se, apesar de serem doutrinas extremamente diferentes, ambas caminhariam juntas em, pelo menos, um aspecto: o fervor dos cultos – ‘performances’ de fé fortemente presentes nessas cerimônias. Também, através dos registros imagéticos, tentei unir as duas religiões tão intolerantes entre si.
Depois que defini meu objetivo, então, parti para a parte prática, quando comecei a frequentar igrejas pentecostais. E admito: as visitas iniciais, apenas como observadora, foram vivências intensas. O estado de transe coletivo, o canto e gritos constantes, juntamente ao choro dos fiéis me assustaram, mas causaram, também curiosidade sobre tudo aquilo. E, como devem ser as nossas experiências na vida, quebraram muitos preconceitos. Com isso, já estava feliz.
Registros feitos, era a vez do candomblé. Mais choque. A riqueza dos ritos e das cores, não tão presentes nos pentecostais, não escondia as semelhanças que eu buscava. O choro, o sorriso, o ajoelhar, o abraçar, tão presentes nesses cultos, já haviam sido vistos nas cerimônias evangélicas. Mais preconceitos quebrados, o que me ajudou a registrar e as doutrinas a um mesmo “ambiente”.
Para mim, nada mais adequado que fotografias para realizar o trabalho, já que o ponto de encontro entre as doutrinas está nas “performances”. No que se vê. Nas expressões corporais tão fervorosamente sentidas por cada fiel ao encontrar seu deus. Do desafio, surgiram 30 fotos – na Igreja Pentecostal Monte Santo, no bairro de Santo Amaro, no Terreiro de Pai Adão, em Água Fria, e no Afoxé Omo Inã, em Mangabeira.”