População analfabeta em Pernambuco “povoaria” 76 cidades
De acordo com dados da Pnad, mais de 1 milhão de pernambucanos com mais de 14 anos não sabe ler ou escrever, colocando o estado na oitava pior colocação do ranking brasileiro.
Apenas os analfabetos de Pernambuco seriam suficientes para povoar um total de 76 cidades do estado. Ao todo, são pouco mais de 1 milhão de pessoas, com mais de 14 anos, que atuam ou não no mercado de trabalho sem capacidade de ler ou escrever. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2015 e revelam o estado como o oitavo pior colocado no ranking nacional de alfabetização. Mesmo dois anos após a divulgação das metas do Plano Nacional de Educação (PNE), uma delas voltada à erradicação do analfabetismo absoluto até 2020, a taxa na população jovem e adulta está longe de serem zeradas e o desafio é ainda maior ao tratar do analfabetismo funcional, envolvendo pessoas acima dos 15 anos com menos de quatro anos de estudos.
Aos que fazem parte das estatísticas de não-alfabetização, a família torna-se ainda mais fundamental. Inúmeras vezes, os parentes viram olhos e voz em meio a uma sociedade construída para quem sabe ler e escrever.
A costureira Carmelita da Silva, 61, cresceu em um sítio de Lagoa dos Gatos, Agreste do estado, sem frequentar a escola e hoje é grata por ter alguém confiável por perto. “Já quis aprender e, há 11 anos, cheguei a me matricular numa escola, junto com três vizinhas. Eu estava gostando, mas, duas semanas depois que as aulas começaram, perdi meu filho em um acidente e então larguei os estudos. Hoje, conto com meu neto, Felipe, que está no 6º ano e já me ajuda com o que não consigo ler” finaliza, com orgulho de quem, tão pequeno, domina algo que para ela, e para um milhão de conterrâneos, parece tão distante.
Desde 2004, o aumento do número de pessoas capazes de ler e escrever em Pernambuco sempre esteve abaixo dos 7%. Há programas para reverter o cenário, como a Educação de Jovens e Adultos (EJA), mas, segundo o professor de pedagogia da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), Edízio dos Santos, ainda é preciso adaptar o sistema de ensino à realidade da alfabetização tardia, não esquecendo que os demais conhecimentos do estudante precisam ser aproveitados. “Ao ensinar pessoas fora de faixa (etária ideal), é necessário interagir com o campo de vida delas enquanto cidadãs. Ensinar as palavras, debater seus sentidos e assimilar letras e sílabas que as compõem são exercícios tão importantes quanto contextualizar o significado e trazer o conhecimento para o cotidiano prático”, pontua.
O desafio, no entanto, não está restrito a Pernambuco. Em todo o país, segundo a Pnad, há 13,2 milhões de pessoas analfabetas com 15 anos ou mais, o que representa 8,3% da população em condições de trabalho no Brasil. A problemática complexa é comentada pela analista educacional Lindomar da Silva, baseada nos seus 38 anos de experiência com acompanhamento escolar. “A escola não andou no mesmo passo que o universo do aluno. Ela ficou para trás. Com isso, ele não se sente pertencente. Sem novos atrativos, as drogas, festas, jornadas de trabalho e o cansaço acabam falando mais alto e resultando no grande índice de evasão, que compromete o aprendizado”, explica.
A especialista também enfatiza a importância do incentivo familiar a quem deseja estudar. “A escola em que trabalho até fez campanhas para trazer os pais dos alunos de volta às salas de aula, pois o incentivo da família no processo de alfabetização é fundamental. Com apoio familiar, os resultados são bem melhores”, conclui, delegando ao afeto e à motivação a força necessária para combater o analfabetismo e reverter as estatísticas, mesmo em meio a tantas dificuldades.
Giovana Ferreira
Repórter
Giovana é estudante de jornalismo da UFPE. Integra a equipe de dados do jornal, no projeto CuriosaMente, desde maio de 2016. Tem encantamento pelas letras e está se descobrindo no mundo dos textos, em que sempre se aprende…
Júlio Jacobina
Fotógrafo
Júlio é integrante da equipe de fotografia do Diario. Fotografa profissionalmente desde os 21 anos e é quem integra, há mais tempo, o corpo de funcionários do setor. Culto como poucos, ensina na lente e nas letras.