Cientistas criam filtros para proteger visão contra a tela do celular
Aparelhos eletrônicos e luzes artificiais são recursos de necessidade básica para uma grade parte das pessoas. A rotina dos que quase nunca desligam, porém, pode ser uma ameça à saúde ocular, já que esses dispositivos emitem o comprimento de luz azul, que tem o poder de danificar a retina. Há filtros que amenizam essa ação prejudicial, mas eles não são 100% eficazes. Por isso, cientistas da Espanha tentam desenvolver uma tecnologia que melhore a proteção. Um protótipo foi testado em ratos e surtiu resultados promissores, apresentados, neste mês, na revista Plos One.
Segundo os criadores do dispositivo, o efeito do comprimento de onda azul sobre a membrana interna do olho não é completamente conhecido, o que torna o investimento em ferramentas preventivas ainda mais importante. “O estilo de vida atual depende da iluminação artificial, que pode se estender até 16, 18 horas por dia na rotina das pessoas. O que preocupa também é que pouco se sabe sobre quais níveis de exposição à luz são seguros para a retina”, explicaram os autores do artigo, liderados por Javier Vicente-Tejedor, pesquisador da Universidade de Alcala, na Espanha.
Os filtros existentes permitem passar até 70% desse comprimento de onda. “Nossos olhos ficam expostos por muito tempo a altos níveis de luz azul, LED de luz, neons. O dano potencial causado pela luz azul pode ser atenuado, é preciso se prevenir”, ressalta a equipe. O dispositivo criado por eles é feito de vidro semelhante ao de lentes, mas bem mais potente, o que aumentaria a proteção.
Os cientistas testaram o filtro em ratos jovens, que foram expostos à luz branca de alta intensidade continuamente durante sete dias. Os animais foram divididos em três grupos: um não recebeu proteção, outro usou os filtros disponíveis no mercado e o terceiro, o protótipo. Depois de uma semana de contato com a luz artificial, as cobaias do terceiro grupo apresentaram a retina mais conservada, além de maior sobrevivência dos fotorreceptores, as células que captam a luz que chega à retina e transmitem para o cérebro um impulso nervoso correspondente à qualidade dessa luz.
“Funções de respostas visuais tradicionais foram significativamente mais conservadas em animais protegidos com nossa tecnologia do que em animais desprotegidos. Além disso, a estrutura da retina foi mantida e a sobrevivência dos fotorreceptores foi maior nos animais protegidos, diferenças notadas nas áreas centrais da retina. Em conclusão, esse filtro de bloqueio à luz azul diminui significativamente os danos dos fotorreceptores após a exposição à luz de alta intensidade”, detalharam.
Ao quantificar e comparar os danos em todas as cobaias, a equipe chegou a um índice de remoção de luz azul de 94%, contra os 70% dos filtros atuais. “Ou seja, o dispositivo que criamos pode proteger significativamente a função e a morfologia da retina. Foi o que comprovamos”, ressaltaram.
Prevenção necessária
O resultado é ainda mais significativo, segundo os autores, quando se considera que a proteção aumentada poderá evitar doenças cada vez mais incidentes em nossa sociedade. “A relação entre a luz azul e doenças degenerativas, como degeneração macular relacionada à idade e a doença de Stargardt, faz com que seja necessário controlar a quantidade de radiação que a retina humana recebe. Essas razões são especialmente importantes dado o nosso estilo de vida atual, tanto do ponto de vista tecnológico – o uso de LED azul em terminais móveis, telas etc. – quanto por uma perspectiva ocupacional, como os turnos noturnos com alta exposição a luzes azuis”, frisaram.
Ana Paula Tupynambá, oftalmologista do centro Visão Institutos Oftalmológicos, em Brasília, explica que a pesquisa espanhola trata de um problema bastante conhecido na área médica. “Todo o excesso de luz azul pode causar algum dano à retina, principalmente de aparelhos eletrônicos, como smartphones. A preocupação é tanta que temos empresas criando esses telefones inteligentes com um filtro amarelo para evitar essa exposição”, conta.
Para Tupynambá, novas tecnologias capazes de impedir esses danos são sempre bem-vindas. “Seria um novo utensílio para essa prevenção, até porque é difícil sabermos qual o tempo de exposição à tela é seguro hoje em dia”, explica. “Outro ponto que vale ressaltar é que a exposição a essa luz também interfere no sono das pessoas, que ficam mais tempo alertas, o que também é prejudicial.”
Adelmo Jesus, oftalmologista especialista em retina e vítreo e membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), também acredita que a tecnologia desenvolvida na universidade espanhola possa ser explorada. “Seria uma nova ferramenta para proteção, mais uma opção que evitaria complicações. Que a luz azul pode causar lesões nós já sabemos. Isso foi comprovado, temos estudos recentes mostrando isso. Por isso, devemos levar esses riscos em consideração”, frisa. “Pessoas que usam óculos, muitas vezes, já estão mais protegidas, pois temos lentes sendo desenvolvidas com essa tecnologia. Os fabricantes têm se preocupado com isso, mas é bom ter opções novas, já que a iluminação artificial é extremamente presente tanto em ambientes internos quanto externos”, complementa.
Perda progressiva
É a enfermidade mais comum de degeneração macular juvenil congênita. Ela caracteriza-se pela perda da visão progressiva, causada pela morte de células fotorreceptoras na porção central da retina, que é chamada de mácula. A mácula é responsável pela visão central do olho, permite ao indivíduo realizar tarefas como ler, assistir à televisão e identificar expressões. Geralmente, o oftalmologista consegue identificar a doença ao ver manchas amareladas na mácula.
(Do Portal Uai)