Mosquitos de zika e dengue viram comida de peixe no interior de Pernambuco

Pequenos, silenciosos e eficazes contra o Aedes aegypti. Um velho aliado no controle de doenças transmitidas por mosquitos voltou a ser opção para controlar o surto de zika, dengue e chikungunya: os peixes ornamentais. Em Riacho das Almas, Agreste de Pernambuco, a 135 km do Recife, as larvas do mosquito estão virando, literalmente, comida de peixe. Isso porque a prefeitura começou a distribuir pequenos peixes guarus, que consomem as larvas do mosquito, diminuindo o índice de infestação predial de 7,9% para 1,9% em 37 dias, eliminando o risco de surto (possível a partir dos 4%).

“As paredes ficavam pretas de tantos mosquitos. Era impossível dormir. Tivemos semanas com 40 casos de dengue”, afirma o diretor do Departamento de Endemias, Dilson Pinangé. “A ideia era jogar alguns espécimes nos açudes, riachos e córregos para que reproduzissem e pudéssemos levar às casas das pessoas. Hoje, temos apenas oito suspeitas de dengue nas unidades de saúde do município”.

A experiência teve início com 40 tilápias, que morreram devido à poluição dos riachos da cidade. Os guarus, mais resistentes, sobreviveram e reproduziram abundantemente, chegando a uma população de 12 mil peixes, distribuídos em baldes de tinta, com custo quase zero para a administração municipal. “Quando descobrimos que eles comiam as larvas do Aedes aegypti, fizemos o ‘peixamento’ de toda a cidade. Hoje, temos dois grandes tanques de criação e podemos doá-los aos municípios que precisem”, garante o prefeito Mário da Mota. Riacho das Almas já fez doação de 4 mil guarus à cidade de Passira e de outros mil à Surubim.

De acordo com a professora do Departamento de Pesca e Aquicultura da UFRPE Maria do Carmo Soares, guarus e guppies estão entre as melhores opções de controle, pois são predadores naturais das larvas. “A maioria dos peixes come o que vê se mexer e acabam comendo larvas por acaso, essas espécies se alimentam especificamente delas, muito, em porções”, avalia, acrescentando que a medida não é inédita. Há registros de controle biológico do tipo desde a década de 1940, pela Fiocruz. Em outros países, como Austrália e Portugal, a iniciativa é ainda mais antiga, tanto que, em inglês, o guaru é conhecido como “peixe mosquito”. Basta uma ou duas unidades desses animais para evitar a infestação em uma caixa d’água, por exemplo.

Plati. creditos: marrabio 2/creative commons

Plati

Tamanho: 5 cm.

Alimentação: Contínua. Quatro vezes mais rápidos que o guppy.

Expectativa de vida: 4 anos.

Temperatura ideal: 27ºC.

Reprodução: Geram até 80 alevinos, de meio milímetro, em um mês.

Guppy. Créditos Inka Crabs/creative commons

Guppy

Tamanho: 5 a 7 cm.

Alimentação: Muitas vezes, pequenas porções de alimentos vivos.

Expectativa de vida: 2 anos.

Temperatura ideal: 24ºC.

Reprodução: 3 semanas gestando. Fêmeas depositam alevinos em plantas.

Betta Splendens. Créditos: defenderregina/creative commons

Betta

Tamanho: 8 a 10 cm.

Alimentação: Uma ou duas vezes ao dia. Também come larvas.

Expectativa de vida: 2 anos.

Temperatura ideal: 27ºC.

Reprodução: Complicada em ambientes controlados.

Guaru. créditos: Lebendgebaerende.Info/creative commons

Guaru

Tamanho: 4 a 5 cm.

Alimentação: Alimentos vivos. Várias vezes ao dia.

Expectativa de vida: 3 anos.

Temperatura ideal: 27ºC.

Reprodução: Gestação de 24 dias e filhotes nascem formados.

No Recife

Há um ano, tem quem compre peixes ornamentais para controle de mosquitos no Recife. E quem garante é Rose Mari Domingues, vendedora de peixes, no bairro de Santo Antônio, há nada menos que nove anos. “Eles pedem um peixe para colocar nas caixas d’água e tonéis com água. Aqui tem guppy, mas sempre ofereço as bettas fêmeas, que são ainda mais resistentes e R$ 1 mais baratas”, afirma, acrescentando, no entanto, que as vendas não aumentaram por conta disso, apenas mudaram os motivos.

A especialista Maria do Carmo, diz que esses peixes, em especial o guppy, conseguem viver em águas poluídas. “Eles precisam de um mínimo de oxigênio para viver. Para reprodução, é bom colocar baronesas ou outras plantas no repositório. É importante também saber que essa água é a da limpeza doméstica e não deve ser utilizada para beber”, explica.

Em entrevista ao Diario, o prefeito do Recife, Geraldo Julio, afirmou que 75% dos focos de dengue estão em reservatórios de água limpa, dentro das residências. O uso dos peixes, no entanto, ainda não está nos planos da capital. A secretária-executiva de saúde do município, Cristiane Penaforte, afirmou que nenhuma medida será descartada e que a viabilidade do uso dos peixes será discutida.

Rose Mari. Créditos: Ricardo Fernandes/DP.

Em todo o país

A experiência com os peixes está sendo realizada em diversas áreas do país. Caruaru, que testou a fórmula em 2013, voltou a apostar neles em projeto-piloto no bairro de Canaã. Experiência semelhante está em andamento em Vargem Grande, no Rio de Janeiro (RJ) e em todo o município de Ipameri (GO), com a espécie guppy. Além disso, a Universidade Federal de Uberlândia (MG), apontou outra espécie aliada no combate ao mosquito e comprovou que a espécie platis consegue comer até 50 larvas em seis horas.

Paulo Trigueiro

Paulo Trigueiro

Repórter